“Nossos professores são quem conduzem nossos alunos para a eficacia e a eficiência dos projetos Enactus em todo o Brasil. Confira agora uma entrevista com a Professora Raquel Soares, que é conselheira do time Enatus UFV Campus de Rio Paranaíba, em Minas Gerais.
1)Primeiramente Prof. Raquel, quando e como a senhora conheceu a Enactus?
Raquel Soares: Conheci a Enactus em abril de 2013, quando dois alunos do campus da UFV Campus de Rio Paranaíba-MG me abordaram no corredor da faculdade explicando que estavam pensando em criar um “time” e precisavam de uma professora conselheira. Pensaram no meu nome porque sempre incentivei a ação empreendedora dos alunos, bem como ressaltei a importância de interagirem com a sociedade na qual estão inseridos. Como conselheira, eu não tinha a menor ideia do que iria fazer, e sequer tinha ouvido falar da Enactus antes. Entretanto, achei a proposta muito interessante, e aceitei o convite de primeira!
2)Nos conte um pouco a respeito de como tem sido a experiência como Professora Conselheira do Time Enactus UFV CRP?
Raquel Soares:Tem sido uma experiência de muito aprendizado, para ambas as partes. Um dos pontos mais ricos para mim é a possibilidade de trabalhar com alunos de diferentes cursos, com nossas múltiplas lentes para enxergar os problemas e soluções. Passei a me dedicar mais à extensão desde então, e o resultado tem sido muito gratificante.
3)Quais foram os principais desafios e conquistas?
Raquel Soares:Os desafios são muitos, tanto no ambiente interno, da universidade, quando externo. Primeiro porque formar um “time”, com qualquer que seja a finalidade, exige muita confiança. Como eu não conhecia a maioria dos alunos, que são de cursos para os quais não leciono, levei um tempo para entender como aquele grupo tão heterogêneo poderia estar unido em torno de um objetivo comum. Acho que encontrar esse ponto foi fundamental. Ainda no ambiente interno, tornar-nos conhecido foi e continua sendo um desafio constante. Muitas vezes temos que responder o que é e o que faz a Enactus, para outros professores, diretores e alunos. Entretanto, podemos considerar que avançamos muito nesse ponto, ainda mais neste ano em que recebemos a visita do Kleber, presidente da Enactus Brasil, que se reuniu com os diretores e chefes de instituto, o que deu uma credibilidade ainda maior para nosso time. A conquista da visibilidade do time internamente também já se faz notar no aumento do número de membros – dos 7 que iniciaram em 2013, a 24 em 2015. Com esse crescimento, tem sido possível vencer outro de nossos grandes desafios – estamos em uma cidade muito pequena. Rio Paranaíba tem 14 mil habitantes. A UFV-CRP é muito nova na cidade, tudo é muita novidade, e estamos construindo nossa reputação na cidade aos poucos. Mas podemos dizer que também tem ocorrido conquistas nesse sentido, em ações como o Cinenactus e o Natal Solidário, que mobilizaram o time Enactus UFV-CRP, a comunidade acadêmica, empresários e moradores da cidade para realização de uma ação coletiva e de interesse de todos.
4)Agora vamos falar de projetos! Qual impacto que o Time Enactus UFV CRP tem causado na cidade de Rio Paranaíba?
Raquel Soares: Começamos os projetos em torno de ideias que tínhamos acerca do contexto local. O nome da cidade, por exemplo, faz menção ao Rio que faz parte de uma das bacias hidrográficas mais importantes do nosso estado, o Rio Paranaíba, que nasce nesse município. Portanto, todas as questões ambientais relacionadas à água são muito relevantes por aqui. O Projeto Resíduos de Valor, por exemplo, que trabalha com a transformação do óleo de cozinha usado em sabão artesanal, tem esse apelo de evitar a contaminação da água dos rios. Mas não é só isso. No início, quando o Haildson, um dos nossos membros fundadores, pensou em desenvolver esse projeto, saiu visitando uma a uma as mulheres que já produziam sabão em suas casas. Uma foi indicando outra, como numa “bola de neve”. E então percebemos que se trata muito mais do que uma questão ambiental. Em nossa cidade, a produção de sabão é uma questão cultural, que passa de geração em geração, de mãe para filha. Elas trocam receitas, aperfeiçoam suas técnicas, doam ou vendem sua produção, fornecendo para familiares e amigos. O que estamos fazendo é fortalecendo esta rede e tentando ampliar o poder de transformação que ela representa, em termos de sustentabilidade.
Já o projeto Reciclar é Preciso vem ao encontro de uma demanda que é a mesma de muitas outras cidades – a destinação e tratamento adequado do lixo. Como não existe aterro sanitário em Rio Paranaíba, o time identificou a oportunidade de intervir junto aos catadores, mostrando o quanto eles poderiam se fortalecer se organizados como Associação. O projeto “Uma em dez – Mulheres de Atitude” teve início com uma pesquisa que eu estava realizando no estado de MG acerca da participação de mulheres na gestão de organizações ligadas ao agronegócio. Como a cafeicultura é uma das principais atividades econômicas em nossa região – do Cerrado Mineiro, verifiquei a sinergia existente entre um projeto de empoderamento de mulheres que poderíamos desenvolver no Time com uma entidade internacional – a Aliança Internacional das Mulheres do Café, que atua no Brasil desde 2012. Só no primeiro Encontro das Mulheres na Cafeicultura da Região do Cerrado, que promovemos em parceria com uma entidade local, reunimos mais de 100 mulheres! E não paramos por aí, estamos reformulando o projeto a fim de torna-lo ainda mais eficaz.
5)O Time Enactus UFV CRP foi o 1ª Time Enactus criado no estado de Minas Gerais e atualmente nos parece ser um dos times com mais engajamento e motivação da nossa rede, sem dúvida, um time que promete! O que tem acontecido no Time que tem dado certo?
Raquel Soares: Como disse, estou com o time desde o primeiro dia. Nestes 2 anos e meio, já estamos em nossa terceira composição. No início era tudo novo, mas os membros eram muito proativos e interagiam demais com os times mais experientes. Mesmo aprendendo muito com os outros, tínhamos dificuldade de nos estruturar. Costumo brincar que a pergunta: “o que vem primeiro, o projeto ou o recurso?” é igual a dúvida entre a galinha ou o ovo. Afinal, como conseguiríamos parceiros e recursos se não tínhamos nada de resultado para apresentar? Tínhamos apenas potencial e promessas, mas nada concreto. Então eu insistia muito com o time na necessidade de pensarem estrategicamente, no médio e longo prazo, agindo no momento certo, alinhados em torno de um mínimo de pressupostos comuns. Sou da área de administração, e portanto, considero que planejar é a base para uma execução bem sucedida. Mas não conseguíamos planejar nada! Por um tempo, fiquei com a sensação que não saíamos do lugar, e aquilo começou a me angustiar. Fiquei desmotivada. Então em junho do ano passado sai de licença maternidade, quando nasceu minha segunda filha, e fiquei afastada do time por um período. Considero que esse momento foi essencial. Primeiro, porque eles tiveram que caminhar sem mim, e isso os levou a amadurecer. Além disso, aproveitei meu período para refletir como poderia contribuir de forma mais efetiva para o sucesso do time. Fiz coaching durante minha licença, pois queria encontrar o equilíbrio entre minhas diversas atividades, e portanto, estava decidida a focar em minhas prioridades. Quase desisti da Enactus mais uma vez. Não estava enxergando como poderia encontrar sinergia entre ser conselheira do time e continuar professora, pesquisadora, mãe, esposa…Então resolvi dar uma “cartada” final: reuni com os diretores do time e disse que daria um tempo para que me mostrassem que estavam de fato empenhados em estruturar o time e os projetos. Da minha parte, eu focaria em oferecer aquilo que tenho mais forte: meu lado professora! Atuo em Gestão Estratégica de Pessoas, e disse pra mim mesma que não admitia abandonar o time sem ao menos tentar usar as ferramentas que ensino os alunos a usarem. Então comecei um trabalho de base, mapeando as competências Enactus, que serviram de base para estruturar nosso processo seletivo, avaliação de desempenho e ações de desenvolvimento do time. Estruturei um projeto de “Educação Corporativa para o Time Enactus UFV-CRP”, com quatro módulos de treinamento ao longo de 2015, um a cada dois meses. Neste ciclo, trabalhamos as competências Planejamento e Organização, Visão Estratégica, Trabalho em Equipe e Sustentabilidade. A evolução do time desde então tem sido notável. Como numa orquestra, estamos mais afinados, sabemos para onde estamos indo, e o que precisamos fazer para chegar até lá. As organizações em geral falam muito em “engajamento”, mas tem dificuldade de colocar em prática aquilo que preconizam. Entendemos que isso passa por ter uma boa estratégia na base. Quando todos estão em sintonia, quem não se identifica não aguenta ficar, sai por conta própria.
6)E o que deu errado e ficou de aprendizado?
Raquel Soares: Considero que nosso maior erro, em termos de projeto, foi a prospecção para o “Uma em Dez – mulheres de atitude na cafeicultura”. Como mencionei, foi um projeto que surgiu a partir de uma pesquisa que eu mesma estava conduzindo, e por isso, pensei que já tinha identificado uma necessidade – empoderar mulheres na cadeia do café. Como temos uma organização em rede na cafeicultura regional – somos a primeira região brasileira a obter uma “DO – Denominação de Origem”, e várias cooperativas e associações interligadas em Rede por meio da Federação dos Cafeicultores da Região do Cerrado Mineiro, apresentei um esboço do que seria o projeto e eles logo abraçaram a ideia. Entretanto, o escopo estava muito amplo, envolvendo uma área geográfica muito grande e o que mais precisávamos – conhecer nosso público-alvo, não tínhamos! O aprendizado que fica é que trabalhar com projetos requer um cuidado muito grande em termos de expectativas e confiança. Desde então costumo dizer que precisamos “dar um zoom” na comunidade, grupo ou público com o qual vamos trabalhar, para depois ampliar. O segundo maior aprendizado, este relacionado à estrutura do time, é que precisamos ter bases sólidas para manter o time em andamento. Os alunos se renovam a cada ano, isso é absolutamente normal, alguns se formam, outros mudam de foco, outros simplesmente desistem. Mas o time deve permanecer, e por isso liderança e sucessão se colocam tão importantes quanto a estratégia. Creio que aqui também está um dos principais papeis do professor conselheiro, já que mantemos nosso vínculo com a universidade enquanto os alunos entram e saem.
7)No Brasil se fala muito do equilíbrio entre ensino, pesquisa e extensão, o famoso ‘tripé’ educacional tão importante para uma boa formação universitária. Contudo ao olhar para a realidade brasileira parece que a extensão é a menos valorizada desse ‘tripé’. Na opinião da senhora, qual é o papel da Enactus na consolidação de uma extensão de qualidade nas universidade brasileiras?
Raquel Soares: Falando mais uma vez com base em minha área de formação, considero que a Enactus oferece uma oportunidade incrível para que o aluno coloque em prática o que aprendeu em seu curso de formação. Do ponto de vista da inserção dos alunos no mercado de trabalho, estes serão avaliados nas empresas por suas competências, ou seja, seu conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes. Costuma-se dizer que conhecimentos – o saber, mais as habilidades – o saber fazer, representam cerca de 30% do potencial e desempenho de um profissional. Suas atitudes representam os outros 70%, e na minha opinião, só tem uma forma de desenvolver atitude: experimentando, tentando, errando, descobrindo-se. Portanto, a Enactus deve incentivar cada vez mais a institucionalização da extensão como essa ponte entre a universidade e a comunidade. Precisamos melhorar nossa linguagem para uma maior aproximação com nossos públicos, usar a pesquisa para encontrarmos as melhores soluções para os problemas, e a didática para transformar tanto conhecimento em novos comportamentos. Com esses três elementos, o tripé estará equilibrado.
Entrevista Por: Guilherme Andrade
Foto: Arquivo Pessoal“